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quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Revista EVASÕES - 18 a 24 de Setembro 2015


Elas não caem do céu. Diz um velho provérbio chinês, «Deus dá nozes, mas não as quebra». Nada que incomode João Machado Teté. Dos céus, só espera que venha bom clima. Do resto trata ele. Há 37 anos, plantou na herdade Monte da Raposinha, nos arredores de Beja, o seu primeiro pomar de nogueiras. Hoje tem 14 hectares, cinco mil pés e 25 toneladas de produção anual, que não chegam para as encomendas.



O seu telefone toca repetidamente. Ora gente que lhe tenta comprar uma ou outra tonelada de produto – recebem um invariável não, a produção fica vendida de um ano para o seguinte –, outros ue procuram aconselhamento para iniciarem a plantação de pomares. Diz não entender por que motivo o procuram. «Há por aí tantos técnicos e engenheiros, eu só gosto de fazer bricolagem nos nogueirais», brinca. Parte é verdade, contudo: a agricultura não é a sua formação. João Teté é um coronel na reserva apaixonado pelo campo. Foi pela sua mão que o panorama da produção nacional de noz se começou a inverter. Até há poucos anos, Trás-os-Montes, região de onde é natural, era a principal produtora.


Hoje é o Alentejo que vai na frente. As nogueiras requerem terras fundas, ricas e bem drenadas, e o Alentejo tem caraterísticas específicas associadas ao tempo quente. O coronel fez as suas experiências. Estava ainda na vida militar ativa quando se iniciou nas lides agrícolas. Começou por plantar a variedade francesa Franquette, muito apreciada em todo o mundo. Acabou por reconverter o pomar para as variedades americanas Hartley e Serr, com porta-enxertos Regia, Nigra, Hinsii e Paradox. «Garantem uma noz de excelência, de grande qualidade e boa produção.» A variedade perfeita é algo que ainda não encontrou, mas não desiste. Tanto é que parte do seu pomar está transformada num laboratório a céu aberto. Por lá se perde diariamente, e alimenta a esperança de um dos 26 netos lhe seguir as pisadas.


Diz outro ditado – este mais célebre entre nós, mas ainda dentro da temática «deus e nozes» – que Deus dá nozes a quem não tem dentes. Talvez seja verdade, mas não será grave. A casca é particularmente rija, é certo, mas o miolo, embora crocante, não exige grande perícia de mastigação, mesmo aos mais desdentados. Na taberna contemporânea Vovó Joaquina (Rua do Sembrano, 57, Beja; (facebook.com/vovojoaquina), não muito longe da propriedade de João Tété, a noz é parte integrante de um dos pratos mais solicitados,o penne Toscana.

Surge caramelizada, junto com espinafres, cogumelos, queijo e a massa que dá nome ao prato. «Um prato de confeção simples, mas sofisticado e muito apreciado», diz o gerente, José Ribeiro, acrescentando que não são só os vegetarianos que o pedem.


Ricardo Santos, chef formador nas escolas de hotelaria de Coimbra e Óbidos e consultor em diversos restaurantes, diz que, com nozes, a dificuldade é decidir o que fazer. «São muitas as possibilidades», explica. Exemplifica essa versatilidade com uma delícia de noz: começa por transformar o miolo em farinha, a que junta manteiga e ovos; o preparado vai ao forno e está feita a base. Segue-se a cobertura, açúcar em ponto de caramelo, natas e miolo de noz caramelizado. A textura fofa do bolo, em contraste com o crocante da cobertura, desperta a gula à primeira dentada. Não lhe faltam usos no receituário popular, particularmente em matéria de doçaria. Só no capítulo das compotas, a noz alia-se na perfeição com abóbora, curgete, goiaba, marmelo, pera, pêssego. E tudo quanto seja sobremesas com chocolate, banana, café, queijo, requeijão ou doce de ovos tem na noz parelha mais do que perfeita. Na sua forma mais simples, coberta de mel, é um manjar dos deuses. Depois, além das virtudes de sabor, há as qualidades nutricionais que lhe são reconhecidas, nomeadamente a concentração de ácidos gordos essenciais, como o ómega 3. «A noz contribui com boas gorduras para o aumento do bom colesterol e redução de doenças cardiovasculares», explica a nutricionista Paula Beirão Valente, que destaca a
importância das vitaminas do complexo D, do cálcio e do fósforo, elementos que contribuem para a proteção dos neurónios e têm um efeito antioxidante. Contudo, deixa um alerta: «Pese ser benéfica, não deixa de ser uma gordura, pelo que deve ser consumida com moderação.» O que, com as devidas variações consoante o tipo de dieta, significará algo entre uma e nove nozes por dia. Segundo um artigo do norte-americano Andrew F. Smith, escritor/historiador perito em alimentação, a nogueira (Juglans regia) é originária da Ásia Central e alastrou-se, durante o período pré-histórico, à China Ocidental, Cáucaso, Pérsia e Europa. Era cultivada pelos povos neolíticos há sete mil anos. A sua produção na bacia do Mediterrâneo só se alastrou com o domínio romano. Atualmente, entre os maiores produtores mundiais encontram-se China (cerca de 420 mil toneladas/ano), EUA (300 mil), Irão (150 mil), Turquia (130 mil) e Ucrânia (70 mil). Portugal está longe desse top, apenas produzindo 4500 toneladas anuais, correspondentes a apenas 10% do consumo nacional. 


Potencial não falta, contudo. Além da sua propriedade, João Tété gere também uma herdade em Monte do Moncorvo, de proprietários russos, onde se prepara para plantar 140 hectares de nogueiras. Os primeiros 1800 pés já chegaram. Dos viveiros espanhóis, espera receber mais quatro mil a breve trecho. O objetivo é plantar 30 mil árvores e, a prazo, criar o seu próprio viveiro.

O ciclo do fruto termina por esta altura do ano. As nozes estão agora a ser colhidas. Após dois a quatro dias de intensa azáfama – entre descasque, secagem, calibragem e depois a distribuição –, estarão nas bancas de fruta de todo o país. Nota para quem compra: é certo que os olhos também comem, mas saiba-se que as nozes branqueadas, embora mais bonitas, têm uma duração muito limitada, entre dois a três meses. Já aquelas que não levaram qualquer tratamento, e são por isso mais escuras, podem ser consumidas nos onze meses posteriores à colheita. 

É também por estes dias que arranca «oficialmente» a temporada das nozes. O pontapé de saída é dado em Arnelas, lugar do concelho de Vila Nova de Gaia que, nos derradeiros dias de verão – prenúncio para a entrada do outono, com um dos seus frutos mais apetecidos –, celebra a Feira de São Mateus. 

Visitá-la é a oportunidade para comprar as primeiras nozes da campanha, mas também para assistir a um ritual secular. Aqui, vendedores e compradores regateiam preços e estipulam o valor que servirá como indicador para a venda do produto em toda a região norte. Papas de sarrabulho e vinho doce com nozes saciam os convivas.


Outras celebrações em torno do fruto se seguem. A de Gondomar, no âmbito das Festas da Cidade, que duram até 11 de outubro e trazem tasquinhas com pratos ou sobremesas à base de nozes. E a da aldeia de xisto de Casal de São Simão, em Figueiró dos Vinhos, onde vinho novo e água-pé fazem companhia ao fruto da festa. É altura de erguer os copos e brindar à chegada do outono. 





11 comentários:

  1. Caro Coronel João Tété,

    Uma vez que já tentei obter algumas informações junto de empresas que fazem candidaturas ao PT 2020, mas todas elas me retratam a aposta na produção de nozes, como um verdadeiro mar de rosas, lembrei-me de pedir a opinião de alguém com muita experiência e sem outros fins monetários.
    Aqui vão algumas questões:

    Quais as espécies aconselhadas sendo que a localização da plantação será na Beira Alta?
    Qual o compasso que devo prever?
    Qual o custo de plantação que devo prever por ha?
    Qual o custo de exploração anual por ha?
    Devo considerar sistema de rega?
    Quais as previsões de produção ao longo dos anos para as espécies previstas? Tenho lido que a partir do 4º ano já temos boa produtividade e ao 7º ano já atingimos o pico de 2500 Kg/ha. Será isto verdade?
    Uma vez que a área não é muito grande (5 ha), é fácil alugar equipamentos para apanha, descasque e secagem? Ou qual será a melhor estratégia?
    Numa área de 5ha é possível fazer o acompanhamento da exploração ao fim de semana, ou exige presença a full time?

    Muito obrigado pela sua atenção.

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  2. Diga para substituírem o mar de rosas por espinhos (se é assim tão bom porque eles não fazem?)
    Na Beira Alta só variedades que exigem bastante frio ( Franquette e Fernor ). Compasso ( 6 x 8 para cima ). O custo plantação( sabendo que tem que ripar a terra, gradar, abrir covas,deitar 5kgs de matéria orgânica, 300 Grs de adubo em conformidade com a análise prévia do solo, plantar e regar, deve ver os preços que aí se praticam).O custo anual (conte com 2 a 3 gradagens, poda de formação, rega e 100grs de Azoto por árvore). A rega é fundamental e de preferência localizada.Produção ( não exageraram muito, pois há quem informe 4 e 6 000 Kgs por Ha, mas são valores de progeto e da folha A4 - a partir do 5º já pode ter uns Kgs e se ao 7º conseguir 1 500 a 2 000 Kgs dê-se por muito contente.Poderá alugar máquinas para vibrar, mas não acredito que consiga para tirar o cascarrão e para secagem.
    Se passar por aqui terei muito gosto em lhe mostrar o meu equipamento. É uma cultura muito exigente e tem que ser acompanhada.





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  3. Caro Senhor João.

    Estive procurando informações sobre variedades de nozes e encontrei este Blog. Estava lendo e observando atentamente sobre o manejo das variedades plantadas em sua propriedade. Como eu estou no sul do Brasil, gostaria de saber se você dispõe de conhecimento de variedades usadas na europa que se adapta no nosso clima ( tem as quatro estações bem pronunciadas mas sem neve).

    Obrigado e bons negócios

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  4. Bom dia Sr. Coronel,

    Tenho acompanhado o seu blog pontualmente! Sou de Trás-os-Montes e fizemos há cerca de 5 anos um projecto de plantação de frutos secos entre estes Nogueiras e Amêndoas. Atendendo às produções estamos com uma dificuldade na secagem das Nozes. As máquinas de secagem que tenho visto são muito difíceis de controlar ou queimam os frutos ou deixam-nos ainda com humidade sendo muito difícil "acetar". Assim pedia a sua ajuda na recomendação de algum equipamento/fornecedor de um equipamento de secagem.
    Antecipadamente grato pela sua atenção e obrigado pela ajuda que disponibiliza com o eu blog.
    Cumprimentos
    José Marcos

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    Respostas
    1. Tenho os meus em alvenaria, funcionando a gaz, construídos há quase 40 anos, com algumas adaptações posteriores e não tenho problemas; se passar aqui no Sul (BEJA), terei muito gosto em lhos mostrar ou ver os seus ,quando for aí a Trás-os- Montes, o que não é tantas vezes como eu gostaria.

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  5. Boa tarde

    Gostaria de saber onde posso comprar nozes Portuguesas na zona de Sintra, Será que posso encomendar?

    Muito obrigada e desculpe o incomodo
    Atenciosamanete, Alexandra Coelho

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  6. Não sei, mas deve procurar nozes Nacionais, pois são de melhor qualidade que as estrangeiras e normalmente são do próprio ano.Encomendar a mim não, porque já não tenho;em Outubro e fins de Setembro vendo, mas em quantidades acima dos 200 Kgs, a p.p. e levantadas na minha propriedade.

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  7. Bom dia Sr.Coronel
    Pretendo plantar algumas dezenas de nogueiras na região de Arraiolos, agradeço que me informe onde posso adquirir os pés de nogueiras.
    Obrigado
    João Mota

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  8. Bom dia Sr.Coronel
    Pretendo plantar algumas dezenas de nogueiras na região de Arraiolos, agradeço que me informe onde posso adquirir os pés de nogueiras.
    Obrigado
    João Mota

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  9. Deve procurar na Internet,pois há viveiros em Vila Real de Trás- os - Montes, na região do Porto, em Coimbra ...Deve é comprar nogueiras, já enxertadas, de vara de 1 a 2 m e de variedades americanas e não francesas, para essa região.

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  10. Boa tarde Sr. João. Antes de mais obrigado pela sua contribuição para o conhecimento geral. Estou a fazer um trabalho para a faculdade sobre nozes e gostava de lhe perguntar se acha que uma grande plantação de nozes (digamos uns 100-150 ha) no Alqueva, com as melhores práticas de gestão, a que produção por ha poderia chegar. Li que há locais no Chile onde as produções podem chegar a 12-14 tons/ha. Porque é que a diferença pode ser tão grande? Muito obrigado!

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